
No dia 1º de julho de 2025, véspera da celebração da Independência da Bahia, Annemone Santos – coordenadora do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR) e referência na luta socioambiental – sofreu um atentado a tiros na sede da Cata Bahia, localizada no bairro de São João do Cabrito, no Subúrbio Ferroviário de Salvador, local onde atua há mais de 15 anos. A ativista escapou ilesa, mas o episódio expõe a crescente violência contra lideranças populares no país.
Além de mobilizar catadoras e catadores por direitos trabalhistas, dignidade e reconhecimento profissional, Annemone integra o coletivo Guardiãs da APA Bacia do Cobre, que atua na defesa do Parque São Bartolomeu – área crucial para a preservação de matas, cachoeiras e territórios tradicionais de Salvador. O grupo vinha denunciando nos últimos anos o desmatamento acelerado e poluição das águas; a especulação imobiliária vinculada à privatização de parques públicos; e a “omissão” do poder público perante a exploração predatória do Parque.
Padrão de Violência
O ataque a Annemone não é isolado. Segundo a Global Witness, o Brasil é um dos países mais perigosos para defensores do meio ambiente e dos direitos humanos, com mortalidade concentrada em mulheres negras e lideranças de comunidades tradicionais.
De acordo com o Relatório Na linha de frente: violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil, 353 defensoras e defensores de direitos humanos sofreram atentados, e outras 47 foram assassinados no Brasil entre 2021 e 2022, totalizando 400 pessoas vitimadas. Cerca de 60% desses crimes foram cometidos por milícias, grileiros e agentes públicos, segundo dados do mesmo estudo.
Além disso, a pesquisa evidencia que, assim como Annemone, as mulheres negras são os principais alvos: dos 353 atentados registrados, 67% foram contra mulheres negras — o que reforça a intersecção entre racismo, gênero e violência estrutural, destacando o maior grau de vulnerabilidade a que essas mulheres estão submetidas.
Outro aspecto é a fragilidade dos mecanismos que deveriam proteger esses grupos. Em 2023, ficaram evidentes as fragilidades do Programa de Proteção a Defensoras/es de Direitos Humanos (PPDDH), após o assassinato da liderança religiosa do Quilombo Pitanga dos Palmares, em Simões Filho (BA), Mãe Bernadete. Ela lutava contra a exploração industrial e a especulação imobiliária que ameaçavam seu território tradicional.
Após o crime, o então Secretário de Direitos Humanos, Felipe Freitas, admitiu publicamente que há falhas críticas nos programas de proteção, tanto em nível estadual quanto federal, como a lentidão na análise de riscos, a falta de recursos e a desarticulação entre as esferas de governo.
A defesa do território é tarefa árdua, nascida não apenas da necessidade de viver, mas da urgência de proteger histórias, comunidades e futuros. É um ato de resistência que transcende o presente — preserva legados ancestrais, guarda a natureza como bem comum e assegura vida digna às próximas gerações. Annemone Santos e as Guardiãs da APA Bacia do Cobre personificam essa luta, enfrentando não apenas a violência explícita, mas um sistema que criminaliza quem defende a terra e os direitos mais básicos.
Exigimos investigação do atentado e desejamos a Annemone vida longa, segurança e força!
A luta continua – porque nenhum/a defensor/a deve morrer por um mundo mais justo!
Comunicação CEAS