Doze anos da Páscoa do Pe. Cláudio Perani

Em homenagem ao doze anos da morte de Padre Claudio Perani, o qual dá nome à biblioteca do CEAS, relembramos aqui a edição nº 244 “Especial Claudio Perani e a Amazônia”.

Também em sua memória, o Instituto Humanitas Unisinos publicou o texto abaixo:

“Quem lembra de Pe. Cláudio Perani, conhece suas convicções. Para ele um missionário, devia fazer emergir os anseios, as aspirações da gente humilde, infundir coragem e apontar as possibilidades do caminho e de uma meta que se devia descobrir e definir com as pessoas, mas não sem elas, ou limitando-se a trabalhar por elas. Suas intuições foram confirmadas, no processo que vivemos em preparação do Sínodo para Amazônia. Onde vivemos um longo processo de escuta, foram três anos de caminhada até a grande assembleia sinodal que aconteceu em outubro de 2019 em Roma.

Podemos afirmar que nestas intuições, ele foi um pioneiro, antecipando muitas das ideias fundamentais do pontificado do Papa Francisco. Sobretudo no sentido dinâmico da missão, dinamismo que cria insegurança em muitos católicos e sacerdotes, porque tira das regras que criam certeza e seguranças. Aquilo que a Cláudio interessava era que se estivesse em caminho. Para ele, era como para os grandes navegadores, para os quais a viagem não é somente instrumento, isto é, meio necessário para chegar à meta, e sim parte da meta, que é descoberta e adquire sua fisionomia exatamente viajando e caminhando com os outros.

Dom Sérgio Eduardo Castrini – Arcebispo emérito da arquidiocese de Manaus, soube descrever o perfil desse grande missionário e homem de Deus que foi o Pe. Cláudio Perani. Ele escreveu uma crônica dois anos atrás lembrando os dez anos da Páscoa do Pe. Perani. “

Por Pe. Paulo Tadeu Barausse, SJ.

Eis a crônica de Dom Sérgio Eduardo Castrini:

Na casa do Senhor tem muitas moradas, mas todas devem estar sempre em caminho se querem restar vivas

“Há dez anos atrás passava por Manaus quando soube da morte, aos setenta e seis anos, do Pe. Cláudio Perani, jesuíta que eu conhecia das Assembleias do Regional Norte I da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Desde a primeira vez que o vi, fiquei impressionado. Homem culto, sóbrio, radical em suas colocações, comprometido com os pobres e com os movimentos de libertação, sonhador e cheio de esperança tinha um olhar que transmitia paz e ternura. Aos poucos fui conhecendo sua biografia e suas convicções teológicas. Quando veio para Manaus, para ser o primeiro superior do grupo de jesuítas que aqui se instalara, já tinha um histórico de compromisso com os pobres que o tinha levado a ser perseguido pela ditadura militar.

A notícia de seu falecimento me pegou de surpresa. Tive a sensação de que alguns projetos e sonhos dele entrariam numa nova fase ou não resistiriam. Ao menos três me vieram a mente; o SARES, a CPT e a equipe itinerante. Participei da missa de corpo presente e depois acompanhei o cortejo até o cemitério. Até hoje me lembro da simplicidade da liturgia eucarística e dos ritos finais junto à sepultura. Nunca antes eu participara de um ritual em que as palavras previstas correspondiam tanto à vida e ao mistério que estávamos celebrando.

A Palavra proclamada foi vivida pelo Pe. Cláudio de forma intensa. Quantos retiros fez e orientou na vida. Era um mestre do discernimento. Ele fez parte de uma geração de ouro que ou já partiu para a casa do Pai, como foi o caso do Pe. Joao Sucarrats, salesiano, ou já se retiraram do campo de batalha, devido à idade e à doença como o Pe. Guidoti.

Eram homens apaixonados pela Igreja e fiéis a ela, não de forma teórica e idealista, mas enraizados na Igreja local. E na última etapa de sua vida ele descobriu a Amazônia e seu povo. Celebrar os dez anos de sua partida, não pode se resumir a homenagens, pois tenho certeza que ele as dispensaria. Mas já é tempo de olhar onde estamos e o que fizemos dos seus sonhos. No fundo queremos e devemos nos perguntar se somos fiéis a Jesus e se nossa Igreja é um sinal de esperança para os humilhados da terra. No dia das suas exéquias eu tinha a certeza que ele entrara no Reino que desejara tanto que acontecesse já aqui na terra. A Igreja existe para que o Reino aconteça no espaço e no tempo. Quando o Reino definitivo acontecer não teremos mais necessidade de mediações e mediadores. Mas enquanto caminhamos neste mundo Deus envia profetas que abrem caminhos. Cláudio Perani foi um destes enviados.

Hoje vivemos outros tempos, mas a pobreza, a miséria e a exclusão de tantos seres humanos continuam a desafiar nossa fé e nossa razão. Não podemos ser ingênuos e é necessário conhecer os mecanismos da morte e da vida. A capacidade de resistência do humano pode nos surpreender. Levar a sério o que vem dos pobres, ouvir suas histórias, conhecer sua cultura, raspar a tinta da opressão que durante muito tempo gerou o silêncio e a dor. Os jesuítas da Amazônia são os guardiães deste legado que também pertence à Igreja de nossa região. Fazer memória é tornar presente. Uma presença que interpela e leva à conversão.”

Fonte: IHU Unisinos