Missão pelas águas e cercamento de nascentes marcam luta popular no sudoeste

Na busca pela defesa do meio ambiente, em especial das águas do Rio Pardo e seus afluentes, diversas comunidades do sudoeste do estado se reuniram no dia 19 de novembro para a 1ª Missão pelas Águas em Cachoeira. O encontro reuniu cerca de 200 moradores das regiões de Macarani, Ribeirão do Largo, Encruzilhada e vizinhas, que saíram em procissão da comunidade do Taquaruçu até Cachoeira, onde também foi realizada a benção de uma das nascentes. A Missão foi organizada pelo Observatório do Rio Pardo em parceria com a Paróquia São Pedro, com a Associação de Pequenos Produtores Rurais de Cachoeira e com comunidades de Cachoeira, Taquaruçu e Rio Bonito.

Edilene Alves, assessora da Equipe Rural do CEAS, destaca a importância da Missão e da proteção das nascentes diante dos graves impactos ambientais provocados sobretudo pela mineração e pelo agronegócio. “Nos últimos tempos, com a perda de alguns territórios para fazendeiros, a comunidade começou a sentir a dificuldade na região, como o aumento dos agrotóxicos e o desmatamento. Então a importância de proteger essas nascentes é imensa, porque a gente tá perdendo os berços de água. Como dizia um senhor já falecido da própria comunidade: antigamente eles entravam nos rios que os cobriam, hoje eles entram nos rios que dão na perna deles”, salienta.

O padre Luís Cláudio acompanhou a procissão e também realizou a benção de uma das nascentes cercadas pela comunidade. Unindo fé e organização popular, os fiéis que acompanharam o trajeto ressaltam que cuidar da natureza também faz parte da missão cristã, como aponta o próprio livro Gênesis da Bíblia, e que a natureza deve ser entendida como parte do bem comum. Na atividade, as organizações que compõem o Observatório do Rio Pardo também leram a Carta da 1ª Missão pelas Águas, um documento que, além de denunciar os problemas ambientais e conclamar o povo para seguir em luta, também traz a fala do Papa Francisco, que aponta que o acesso à água potável e segura é um direito essencial, fundamental e universal dos seres humanos.

Água que brota da luta

A 1ª Missão pelas Águas faz parte de uma série de projetos e mobilizações em defesa do meio ambiente na região. Um deles é o projeto de cercamento de nascentes desenvolvido pelo CEAS desde 2018. O cercamento é uma medida de proteção dos berços de água contra a ação humana e de animais, o que contribui para a revitalização dos rios na região. Desde o início do projeto, já foram cercadas 11 nascentes, 9 delas só na região de Ribeirão do Largo e Encruzilhada. A previsão é que, até o fim do ano, mais uma nascente seja cercada.

Edilene destaca que, desde que o projeto teve início, os moradores já vêm sentindo o impacto do cercamento. “Hoje a gente já ouve relatos de que a água aumentou. A tendência é essa, porque se você cerca a nascente, a própria vegetação nativa começa a voltar e a água volta a germinar até em lugares que secou por causa da pisada dos animais”, aponta a assessora.

No dia 22, a comunidade se organizou para o cercamento de mais uma nascente. Dona Mariana, membro da Associação Vila Corina, é moradora do terreno em que essa última nascente foi protegida e reforça a necessidade de preservação das águas. “Eu tô muito honrada por terem fechado minha nascente. Você que tem uma nascente, feche a sua também. Eu incentivo e falo porque daqui a um tempo essa água vai renascer, vai rebrotar, a gente vai plantar mais árvores na cabeceira. E isso fica para os nossos netos, nossos filhos, para o próximo e toda a população. Quando a gente fecha a nascente não é só pra gente, é pro outro também. Vamos renascer as nascentes!”, salienta a moradora.

Organização popular na defesa das águas

Edilene destaca ainda que a proteção do meio ambiente só é possível a partir da organização das comunidades na luta e defesa do seu território. A assessora aponta que essa tem sido uma das marcas do projeto de cercamento – o envolvimento de diversos moradores na realização das atividades. “No cercamento dessas sete nascentes que têm na comunidade, todas as pessoas do entorno se envolveram, seja pra ir pro cercamento, pra fazer a alimentação das pessoas… isso mostra a grande força do povo”. 

O cercamento das nascentes e a Missão das Águas são apenas o primeiro passo na defesa do meio ambiente, como aponta a assessora. A partir dessas atividades, os moradores também têm identificado e se organizado para lutar por outras mudanças que vão beneficiar a natureza e toda a comunidade. 

“Ao mesmo tempo que se organizam pra defender esse território, se organizam também pra defender as questões sociais da comunidade, discutir as melhores maneiras de cultivo… a partir desse debate de cercamento, a comunidade também começou a discutir a necessidade de uma produção saudável, de produzir organicamente, sem uso de venenos. “Por isso é importante a gente se organizar, a gente lutar em conjunto com as comunidades vizinhas”, finaliza Edilene.